terça-feira, 24 de dezembro de 2013

Sem dizer tchau

Quando ela saiu do quarto vestindo o vestido preto com bolinhas brancas que ele tanto gostava, as duas malas, uma em cada mão, não combinavam com a cena, ela estava linda, perfeitamente arrumada, o laço combinando com o vestido, o batom vermelho, que ele adorava e o salto quinze.

Todas as luzes do apartamento estavam apagadas e enquanto os relâmpagos da tempestade iluminavam toda a sala, ele parecia não acreditar no que estava vendo. A única reação que teve foi tirar os pés de cima da mesa de centro, que já tinha pra mais de dez garrafas de cerveja vazias e o cachimbo apagado descansando ali.

Tocava ♪"billie holiday - gloomy sunday"♫ repetidas vezes enquanto ele olhava atônito para a porta, enxugou os olhos, olhou para ela como quem acaba de se levantar de um nocaute. Foi andando lentamente em sua direção e tentou abracá-la, negado, ela sequer levantou os braços, enquanto engolia seco, ela já não conseguia mais sequer aguentar o cheiro dele.

            "Eu cansei das suas mentiras, cansei de você saindo todas as malditas noites como se eu não fosse entender, o problema não eram as outras, o problema eram as mentiras. Meu coração deve ter mais cicatrizes do que qualquer veterano de guerra, eu queria ir embora sem você estar aqui, eu queria ir embora sem dizer tchau, não para te poupar de nada, mas para me poupar de seu maldito teatro hipócrita de pseudoamor"

As palavras dela soaram como tiro no seu peito, ele olhava para aquela mulher que um dia foi tudo que ele podia ter de amor em sua vida e agora estava totalmente descrente do que ouvia, aquela boca que tanto o beijou, aquele corpo que tanto o amou, agora apenas o machucava. 

Ela já não aguentava mais, já não podia mais suportar nada, as malas já estavam prontas há muito tempo, a coragem foi que chegou depois, o amor foi quem saiu primeiro. Não levava nada que trouxesse qualquer lembrança dele, sequer o amor, não era uma despedida, era um corte, um rompimento, uma mudança brusca e violenta de direção.

Ele parou de abraçá-la, deu um passo pra trás, a encarou pela última vez, olhou para a varanda do apartamento no vigésimo andar. Iria se jogar, os olhos desaguando em lágrimas de uma tonelada, com mais de um milhão de tristezas e lembranças em cada palavra muda que ele não gritava.


     "Se você for se jogar vai chegar mais rápido do que o elevador lá em baixo, aproveite então e se jogue com as malas e quando chegar lá em baixo as coloque no porta-malas do táxi pra mim, por favor"

Depois saiu e fechou a porta, levando as malas, ele não iria se jogar. Foi embora sem dizer tchau, sem despedida, só não pôde ser poupada do maldito teatro de pseudoamor que ele fez.

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Cinzenta sexta clara

"O céu com nuvens cinzentas que descarregam toda a mágoa de um ano inteiro em plena a sexta feira"

Em dias assim lembranças vem e vão, você anda pela casa, come alguma coisa, senta na frente do computador, procura o que fazer... As vezes é melhor não fazer nada, olhar os pingos batendo na janela, apagar as luzes e curtir os relâmpagos iluminando todo o quarto, enquanto os trovões estremecem as paredes, como aquela velha voz lhe estremece quando fala bem de perto.

Existe aquela vontade de estar perto daquele sorriso de novo, vai ver a sexta feira tá tão cinza por isso... Ela nem sabe, mas plantou semente no solo fértil da minha cabeça, a chuva veio para essa semente brotar e crescer, mas só brota depois que o sol chegar, se o sol chegar... 

"Será que ela parou de sorrir?"

Eu gosto da chuva, gosto quando ela vem acompanhada de um vento que diminui um pouco a temperatura, trazendo uma sensação de calma e de paz, fazendo você entrar por debaixo das cobertas e apenas se entregar ao não fazer nada, as vezes é preciso chover assim na gente. 
       

                  "As vezes um banho de chuva lava a alma"

Mas em meio a tanto cinza mais cedo ou mais tarde a chuva vai passar, os raios de sol virão, trazendo a sensação de vida para muitos e de inquietação em mim, mas é necessário, é preciso que o sol venha para que a alma que a chuva lavou esteja pronta para viver o que ainda não viveu, afinal tudo que a chuva levou embora deixou muito espaço para que coisas novas floresçam nessa nova alma, que agora precisa de sol para entender o que é luz.
    

         "O sol voltou, será que ela sorriu de novo?" 

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Fotofobia

Era minha casa, meu quarto, mas o vestido amarelo jogado no chão deixava bem claro quem era a dona daquele lugar. Como vou esquecer aquela cena? Você entrando pelo quarto, só de calcinha, comendo um pão e segurando um copo de suco, como se tudo fosse tão banal quanto um lanche. Ainda lembro de você levantando e tomando um pequeno susto porque eu já estava acordado. 
    
    "Oxe! Por que não me acordou também?"

O nosso sexo era sempre muito bom, a forma como nossos corpos se completavam, o jeito como você me olhava, suas unhas rasgando a minha pele e seus dentes cravados na minha alma, depois as gotas do chuveiro fazendo o papel de reavivarem a dor e a lembrança viva de você. O jeito como você dispensa o cobertor e jogava sua perna encima de mim, falava no meu ouvido: "Pra que pano se temos nossos corpos?" 

Era tudo muito estranho, a forma como as vontades um do outro iam sendo atendidas apenas pelos olhares e gestos, os pequenos sons indicando que tudo estava sendo muito bem feito e os peitos que se encostavam dando pra sentir o reflexo das batidas aceleradas dos músculos cardíacos frenéticos e desesperados. 

   "Mas eu gostava mesmo era do jeito que as nossas testas se encontravam, fazendo as nossas almas se beijarem" 

Era o presente com a sua capacidade de ser futuro e passado ao mesmo tempo que nos regia, nos guiava, eu odiava quando ele era futuro e odeio agora que ele é passado, preferia quando era presente, só presente, nosso presente. 

Estávamos como corpos celestes alinhados, causando espanto em todos, gerando místicas e até fundando religiões enquanto na verdade era apenas parte do nosso movimento natural, nos alinharmos e depois sairmos do alinhamento, como dois corpos celestes que ocupam seus lugares no espaço e se encontram de períodos em períodos para fazer o fantástico acontecer.

E então um dia tudo se foi, mais uma vez estávamos fora do alinhamento, agora repousa em outros lugares, se alinha a outros planetas e se faz dona de outras casas, as vezes volta, as vezes eu não quero que volte, atendia ao meu pedido pra não brilhar tanto, tenho fotofobia. Falando nisso, aproveita que você tá saindo e apaga a luz, por favor.

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Sentir o não sentimento

Não sente fome, não sente sono, não sente nada. Não é fácil, não é difícil, não é nada. Não faz pensar, não faz agir, não faz correr, não faz parar. Não tem como ser medido, ser calculado, ser entendido. É o ET, o diferente, já viveu muitas vidas, aguenta tudo. Fala tudo que ninguém fala, vive do jeito que ninguém vive, passa por todas as coisas antes de todo mundo e sempre tem uma palavra pra dar.

A razão, a emoção, o amigo, o irmão, o amante, o ninguém. O apoio, a muleta, o fiel conselheiro, a loucura em pessoa, o centro de toda esperança. O bom beijo, as costas a serem arranhadas, a gota d'água. A passagem das fazes ruins, o estranho, rejeitado, desejado.

O desejo de toda paz, amor e luz para todx, o tempo todo. Tudo que se faz por alguém, sem esperar a volta, tudo que se viu em relatos loucos, sem esperar pelo entendimento. O que sente sem sentir, o que passa sem passar, está aqui e não está, em todos os lugares e em lugar nenhum.

Existindo sem existir, o tempo todo. Passando o tempo para si e para todx, para ninguém e para alguns. A vida e morte em um pedaço de alma longo e arranhado, alguém que não passa onde todos passam e anda por onde ninguém foi. Alguém que sente o que não existe e existe o que não sente.

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Allegro sem dó

A novidade veio dar na praia de minh'alma, vieram loucas, as novidades, todas elas, enchendo tudo de muita vida. Em qualidade rara de sereias, várias sereias, ai ai, as sereias. Me pegam, pobre navegante perdido nesse mar sem dono dos amores. Ah, os amores, tantos e cada um com seu encanto, cada um com sua verdade, sem mentiras nem vaidade, o ciúme é só vaidade.

Tudo está tão calmo hoje que chego até a estranhar, até o vento está batendo devagar na janela, mas, não faz calor. O ventilador ligado forma uma espécie de canção de ninar, como uma sinfonia louca do sono. O ritmo pesado das batidas do meu coração marcam o estranho tic-tac de momentos felizes, não, eu não sou feliz, eu estou feliz, é bem diferente. 

Se você tem a felicidade como objetivo final, sinto muito em lhe dizer mas você vai morrer sem alcançar o seu objetivo. Pessoas não são felizes, nem tristes, elas ficam felizes, são momentos, alegrias que se encaradas dessa forma, devem ser aproveitadas até o última gota, como uma bebida ou uma comida que você sabe que raramente vai encontrar de novo.

As tristezas também vem, são inerentes, fazem parte de nós, entretanto alegre-se mais, cultive alegrias e felicidades. As tristezas? Deixe-as passar, elas irão passar. Seja senhor do seu sorriso, dono da sua cabeça, evite achar que tudo isso depende de elementos externos a você.

Eu guardo as memórias com carinho, com cuidado, na liberdade do amor eu venho cultivando memórias belíssimas. Algumas são tão rápidas, como um raio, brutal, intenso, forte... Caiu e pronto...Caiu e pronto. Outras são gostosas, lentas, tem sabores, cores, cheiros e sons, tem cheiro de praia com nascer do sol e gosto de gentileza com novidade. 

Alegre-se sem dó nem piedade da sua tristeza, viva-se, viva ser! Se pergunte, se ajeite e se aproveite, eu garanto que você vai se adorar. Evite as coisas ruins, evite o apego, ele é uma doença, ame, ame muito, ame descontroladamente, ame descaradamente e se um dia alguém te desamar, por favor, ame mais e mais. Enfeite o seu caminho ao som dos allegros da sua felicidade que as outras felicidades irão te procurar e no encontro das felicidades alheias não seja alheio ao seu próprio caminho mas não se importe em entrar por caminhos outros.

Hoje foi um dia comum aparentemente, até agora nada, ou até agora tudo, até agora eu, agora até o mundo. O lago profundo da normalidade resolveu se estabelecer no hoje, apenas no hoje, tudo muito normal, tão normal que chega a ser anormal. E ainda todos esses filmes alegres que não param de se repetir. Hoje mais um dia normal, alegremente normal, felizmente normal.

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Próximos

Foram quatro anos, do primeiro olhar sem volta até as primeiras palavras trocadas, de um menino bobo sem muito a dizer para um novo menino, ainda bobo, com um pouco mais de histórias pra contar. Foram cinco anos, do primeiro olhar sem volta até o primeiro beijo... Até a primeira vez entregues de fato.

Um sentimento torto, complicado mesmo de entender mas nem um pouco complicado de viver, aproveitar, estar dentro. É amizade, de fato é mas é um pouco mais, esse um pouco mais é aquela parte gostosa que a gente não entende nada mas AMA viver.

Pouco tamanho, muitas coisas na cabeça e no coração, até demais e aqueles olhos verdes, onde é muito fácil se perder, profundidade imensa, chega dá medo de se afogar. Se os olhos são de fato a janela da alma, por trás daqueles olhos verdes existe uma das almas mais lindas que eu já vi.

Foram dois anos afastados, coisas da cabeça e do coração, coisa de quem não sabe o que fazer com o que tem nas mãos ou está em outras mãos. Esse tempo sem estar próximos foi bom, eu vivi um amor, cresci e apesar de ainda ser bobo (Eu nunca vou deixar de ser bobo) Passo longe dos dois meninos, tanto o que você conheceu quanto o que só te olhava.

Mas voltamos a ser próximos, você já sabe disso tudo. Próximos de novo estamos mais juntos, mais perto, mais amigos e mais...Mais. São olhos, mãos, bocas, testas e corpos inteiros bem próximos e eu espero que pelos próximos anos nós continuemos assim, bem próximos.